Interrupção voluntária da gravidez até às 10 semanas.
SIM à despenalização

Actualmente todos nós vivemos um momento de debate sobre a interrupção da gravidez. Contudo estou convicta que todos temos como ideal que nenhuma mulher tenha que recorrer à situação extrema de interromper a sua gravidez.
Acontece que nas situações, designadamente de perigo de morte, de grave e duradoura lesão, de alta probabilidade de que o feto venha a nascer com grave doença, ou de malformação congénita, ou ainda que a gravidez tenha resultado de violação, todos aceitamos que a mulher interrompa a gravidez, em prazos que vão das 12 às 24 semanas, consoante a situação, nos termos da lei vigente (Código Penal).
Mas, se a mulher devido à falibilidade do contraceptivo utilizado engravidar, e por imaturidade para assumir a maternidade, ou por ausência de uma relação familiar sólida, não tiver a coragem, ou a força necessária para assumir a gravidez? Devemos aceitar a sua decisão, (em alguns casos tomada com o marido ou a família, em outros casos, sem essa possibilidade) ou devemos condená-la?

A lei condena a mulher à pena de prisão até três anos, logo empurra-a para o chamado “ aborto clandestino”, e este é indubitavelmente um verdadeiro flagelo social.
A prática clandestina da interrupção da gravidez, é sempre uma situação deprimente, humilhante e perigosa para a mulher e vergonhosa para toda a sociedade, sob vários pontos de vista quer psicológico, quer da cidadania, quer da saúde. Mais, é um verdadeiro atentado à dignidade da mulher e não se coaduna com o estado actual do desenvolvimento social e humano.

É à luz das novas doutrinas defensoras dos Direitos Humanos que esta situação tem que ser analisada, ou seja, na base de uma doutrina moderna que tem como fito a preocupação com as pessoas humanas, assentando em princípios como a dignidade, a igualdade, a tolerância e não na base da hipocrisia, do autismo da discriminação ou da indiferença. Foi graças à evolução do pensamento, que foi possível, designadamente, revogar a lei que permitiu a produção, em 3-5- 52, do Acórdão da Relação de Lisboa, que face aos maus tratos infligidos pelo marido à mulher declarou legitima a “ moderada correcção doméstica ” da mulher pelo marido.

É necessário evoluir para o efectivo respeito dos direitos humanos e da dignidade da mulher. É necessário abordar os problemas sem hipocrisia, sinalizando-os, identificando as causas, procurando as soluções (desde o tratamento das consequências à prevenção da ocorrência) e defendendo a aplicação das soluções encontradas.
Nesse sentido, em conformidade com o direito internacional e na sequência das convenções internacionais, têm convergido quase todas as leis dos países da união europeia que reconhecem e tutelam o direito à IVG (interrupção voluntária da gravidez), por períodos até superiores às 10 semanas.

É também nesse sentido que a sociedade portuguesa está a evoluir, e é nesse contexto que é colocada em referendo a seguinte questão: Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?
A questão não consiste em saber se concordamos com o aborto, mas, em saber se concordamos com a condenação da mulher que interrompa voluntariamente a gravidez, até às 10 semanas. A resposta conduzirá à alteração à Lei, ou não, consoante se vote sim ou não.
Se a maioria votar sim a lei despenalizará as mulheres que nas primeiras dez semanas de gravidez interrompam a gravidez. Se a maioria votar não, as mulheres continuarão a ser acusadas, julgadas e condenadas como criminosas a cumprir pena de prisão.

Mas como o problema, além de ser social é também de saúde pública, necessita também de uma solução a este nível. Por isso, se o sim ganhar, a lei incluirá a protecção na saúde ao fazer depender a despenalização da sua prática num estabelecimento de saúde legalmente autorizado, permitindo assim o aconselhamento técnico, os necessários cuidados médicos e o respectivo planeamento familiar e que poderá ter um efeito dissuasor, bem como reduzir os riscos, quer pelos meios utilizados, quer pela higiene, quer pela intervenção atempada. Caso ganhe o não, a mulher só terá como recurso o aborto clandestino, nas condições que os seus meios económicos o permitirem, como uma criminosa, correndo o risco de infertilidade ou mesmo de morte, além da eventualidade de deixar órfãos outros filhos.

Pelas razões expostas no próximo dia 11 vou votar SIM, para que o Código Penal despenalize as mulheres que nas primeiras dez semanas de gravidez interrompam a gravidez e apelo às outras mulheres e homens que o façam também, contribuindo para uma sociedade mais digna, solidária e tolerante.


Esmeralda Salero Ramires
Deputada pelo GP/Partido SocialistaMembro do Secretariado do D.F. Mulheres Socialista

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